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segunda-feira, 26 de julho de 2010

CHAMA POÉTICA "Afrodite"






AGRADECENDO DOCES A STELLA LEONARDOS

Doces de açúcar e gemas
São teus versos, e teus doces
Sabem a poemas: não fosses
Toda doce em cada poema

Pouco e coco rimam, sim,
Mas quando o coco é seu coco,
Que, por mais que seja é pouco
(Pelo menos para mim!)

Não veio doce, mas veio
Verso seu, que me é tão doce
Como se doce ele fosse:
Mais que doce: doce e meio

Manuel Bandeira


NÃO COMEREI DA ALFACE A VERDE PÉTALA
Vinicius de Moraes

Não comerei da alface a verde pétala
Nem da cenoura as hóstias desbotadas
Deixarei as pastagens às manadas
E a quem maior aprouver fazer dieta.

Cajus hei de chupar, mangas-espadas
Talvez pouco elegantes para um poeta
Mas peras e maçãs, deixo-as ao esteta
Que acredita no cromo das saladas.

Não nasci ruminante como os bois
Nem como os coelhos, roedor; nasci
Omnívoro: dêem-me feijão com arroz

E um bife, e um queijo forte, e parati
E eu morrerei feliz, do coração
De ter vivido sem comer em vão.


"DOIS E DOIS SÃO QUATRO"

Como dois e dois são quatro
Sei que a vida vale a pena
Embora o pão seja caro
E a liberdade pequena
Como teus olhos são claros
E a tua pele, morena
como é azul o oceano
E a lagoa, serena

Como um tempo de alegria
Por trás do terror me acena
E a noite carrega o dia
No seu colo de açucena

- sei que dois e dois são quatro
sei que a vida vale a pena
mesmo que o pão seja caro
e a liberdade pequena.

Ferreira Gullar 


CAÇAROLAS
Flora Figueiredo

Eu me preparo todo dia como se você fosse chegar:
Engomo a saia de fustão,
Aparo a sobrancelha,
Mantenho o decote sem botão,
Lixo a unha vermelha,
Varro o quintal,
Escovo o cão,
Podo a azaléia,
Tiro a colméia
Que se expande na quina do telhado,
Já querendo invadir a casa ao lado,
Ponho toucinho na panela de feijão.
Camisola de alça,
Lavanda no regaço,
Pedra falsa no pescoço,
Eu resisto à força do cansaço.
O que é que eu faço amanhã pro seu almoço?


PSICANÁLISE DO AÇÚCAR

O açúcar cristal, ou açúcar de usina,
mostra a mais instável das brancuras:
quem do Recife sabe direito o quanto,
e o pouco desse quanto, que ela dura.
Sabe o mínimo do pouco que o cristal
se estabiliza cristal sobre o açúcar,
por cima do fundo antigo, de mascavo,
do mascavo barrento que se incuba;
e sabe que tudo pode romper o mínimo
em que o cristal é capaz de censura:
pois o tal fundo mascavo logo aflora
quer inverno ou verão mele o açúcar.

Só os bangüês que ainda purgam ainda
o açúcar bruto com barro, de mistura;
a usina já não o purga: da infância,
não de depois de adulto, ela o educa;
em enfermarias, com vácuos e turbinas,
em mãos de metal de gente indústria,
a usina o leva a sublimar em cristal
o pardo do xarope: não o purga, cura.
Mas como a cana se cria ainda hoje,
em mãos de barro de gente agricultura,
o barrento da pré-infância logo aflora
quer inverno ou verão mele o açúcar.

João Cabral de Melo Neto

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